Conheça o baiano que fará 225 km de triatlo com uma perna e um pulmão; vídeo

Foto: Instagram

Um “treininho básico” de 120 quilômetros pedalando e 12 correndo. Está achando muito? Essa foi a programação do baiano Fábio Rigueira, de 46 anos, apenas no último fim de semana.

Assistente administrativo em horário comercial, ele divide seus dias em atividades intensas de natação, corrida e ciclismo, preparando-se para participar, pela segunda vez, do Ironman full, o maior circuito de triathlon (ou triatlo) do mundo, que acontece no dia 26 de maio, em Florianópolis.

A rotina pode ser comum a atletas, mas o detalhe é que Fábio completará o percurso utilizando muletas. Ostenta, inclusive, o título de primeiro brasileiro a realizar tal feito, no ano passado, além de ser vice-campeão da prova e campeão baiano da modalidade. Ao todo, são 225,8 quilômetros, dos quais 3,8 Km nadando, 180 Km pedalando e 42 Km correndo.

SUPERAÇÃO

A história de superação desse homem nascido em Salvador começou em 1981, quando tinha nove anos. Após uma queda “sem grandes proporções”, a qual não provocou sequer escoriações, ele começou a sentir dores na coxa, o que durou algumas semanas, até que seus pais o levaram ao médico. Ao fazer exames, foi diagnosticado com osteossarcoma (um tipo de câncer) no fêmur, o osso mais longo do corpo humano, localizado na coxa.

“Naquele momento, o que poderia ser feito era a amputação, para evitar que a doença se espalhasse”, explicou ao Aratu On. Ainda assim, três anos depois, foi constatada metástase no pulmão direito e o então garoto precisou passar por cirurgia para retirar dois – dos três – lobos pulmonares. “Hoje, são uma perna e um pulmão, praticamente, fazendo tudo o que venho fazendo no esporte”, pontuou.

Ao portal, o médico oncologista do Núcleo de Oncologia da Bahia (NOB), André Bacellar, explicou que esse tumor é bastante agressivo e comum nos ossos, principalmente em pessoas com idade entre 0 e 19 anos. “Geralmente se dá na tíbia ou no fêmur e a dor é o principal sintoma, podendo se apresentar até com fratura”, destacou.

Apesar de o pilar do tratamento ser cirúrgico, há resultados melhores quando o paciente faz quimioterapia, antes. “A cirurgia avançou bastante, com técnicas de enxerto e prótese, e o objetivo é preservar o membro, porém a amputação é uma possibilidade, sim”, disse o profissional de saúde.

Quanto à metástase no pulmão, ele afirmou que é algo frequente, também, em pessoas acometidas por esse tipo de câncer. Por isso, os médicos costumam pedir uma tomografia do tórax após o diagnóstico. “Não sabemos os fatores de risco. Existem síndromes genéticas associadas, mas são minoria”, falou. Bacellar alerta, então, para cuidados iniciais: “quase sempre é possível diagnosticar com um simples raio-x”.

FÁBIO E O TRIATHLON

Mesmo com a doença, Fábio não esbarrou na palavra ‘limite’ e o esporte surgiu “de forma natural” em sua vida, pois tem como grandes incentivadores um tio ciclista, Laerte Queiroz, e outro triatleta, conhecido como Zé Muralha. “O exemplo veio de casa. Já convivia com todo o cenário baiano, o que me deu muita força”, contou.

Ele, que já nadava e surfava, nunca teve uma modalidade específica, nem rotina de treinamento, mas foi convencido por Muralha a praticar na piscina. “Resisti, mas fui e gostei. Cheguei a fazer a travessia Mar Grande-Salvador e depois comecei a fazer viagens de bicicleta [mountain bike/cicloturismo]. Só não corri porque pensava: ‘de muleta?’, nunca havia visto nada do tipo… e quando você vê, você se inspira e busca se superar. Este é o grande motivo, inclusive, de eu dar continuidade à minha história”, afirmou Fábio, que chegou a usar três tipos de próteses, mas não teve adaptação.

Zé Muralha, o grande incentivador do sobrinho. Fotos: arquivo pessoal

Para reunir suas duas práticas, o ciclismo e a natação, que o assistente administrativo escolheu o triathlon, mas ainda faltava a corrida. “Comecei a correr através de um time de futebol que existe aqui em Salvador. Foi quando percebi que tinha condições de ir mais um pouco e disse: ‘agora é hora de fazer o grande desafio da minha vida, o Ironman’, um sonho meu. Meu tio falava sempre, então fiquei com isso na mente. Quando procurei as pessoas-chave para essa realização, vi que era possível”.

PREPARAÇÃO

Enquanto muitas pessoas levam anos se preparando para o circuito, Fábio se organizou em apenas seis meses. “Inicialmente me chamaram de ‘ousado’, mas depois me parabenizaram”, revelou.

Para conseguir resultados como esse, o dia de Rigueira é “muito dividido”, principalmente por causa da carga horária de trabalho, de oito horas. “Tenho que me virar nos 30”, brincou. “Acordo às 3h30 da madrugada, pois sempre tem atividade no início da manhã, seja ciclismo ou corrida, e à noite eu faço a natação. No meio do dia, academia ou fisioterapia. O triathlon é diário”, lembrou.

Sua jornada de treinamento tem variações. Algumas semanas são focadas na corrida, com uma média de 10 Km/dia, e outras na bicicleta, mas sempre com natação. No dia do chamado “longão”, corre 32 Km, enquanto a bike faz um volume maior, de 90 a 150 Km.

https://youtu.be/FTFR4l-1BvI

INVESTIMENTO

Contudo, a vida de paratriatleta tem (literalmente) seu preço, ainda mais sem patrocínio. “São três modalidades em que todo equipamento custa muito caro, desde a roupa, tênis, óculos, acessórios, até à bicicleta [na faixa dos R$ 20 mil], fora a inscrição na competição [por volta de R$ 3 mil] e o acompanhamento de profissionais como nutricionista, fisioterapeuta, educador físico…”, contou.

A bike que utiliza hoje é seminova e foi doada por um amigo de seu tio, em troca de que Fábio o ajudasse em seu projeto social. Também não tem nenhuma adaptação com exceção do pedal esquerdo, que foi retirado “para evitar acidentes”.

Foto: André Pivoto/reprodução/Instagram

Atualmente, o assistente administrativo consegue dar seguimento ao projeto – para realizar o Ironman e outras provas – graças a contribuições de amigos. Criou, também, uma vaquinha virtual que vai até o dia 3 de maio e cuja meta é R$ 7.150. “Nós vivemos em um país que tem a cultura do futebol, então outras modalidades esportivas ficam meio que ‘adormecidas’ para um grande investimento. Por isso, aproveito e deixo meu apelo para que olhem para outros esportes. Temos grandes atletas que trazem ótimos resultados”, refletiu.

INSPIRAÇÃO

Com tranquilidade e bom humor aparentes, Fábio revelou que nunca pensou em desistir. “Entendo as complexidades e que temos que ter muita responsabilidade para fazer tudo com segurança, mas o pior momento da minha vida eu venci”, afirmou, sem deixar de mencionar o apoio da esposa, Alê Marques, formada em comunicação e que o ajuda nessa área, além da família e amigos, imprescindíveis em seu crescimento.

“Hoje represento uma faixa da sociedade que vive com essa questão de amputação, do câncer… Fazer um grande desafio como o Ironman inspira outras pessoas na mesma condição que eu a acreditarem que também podem. Não é uma história só minha”, concluiu.

Siga Fábio no Instagram – @fabiorigueira.tri.

Fonte: Juana Castro | Aratu On

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